1. Vínculos de Moçambique ao espaço Índico setecentista.
Em Moçambique setecentista, o comércio e grande parte da vida económica esteve sob o domínio de uma minoria indiana oriunda do Guzerate[5].
Pelo menos desde 1686 - data em que o monopólio das viagens comerciais para a costa oriental africana passou da mão dos capitães das «praças do Norte» da Índia, para a dos comerciantes hindus e jainas, vulgarmente chamados de baneanes, a maioria residente em Damão e Diu -, foi manifestamente evidente a vitalidade da sua presença económica e social, em diversos domínios da economia moçambicana.
Do monopólio das viagens ao monopólio da actividade comercial na costa oriental africana, foi um pequeno passo. A coroa ainda tentou opor-se, mas, no fim de contas, sem grande sucesso. Com muito esforço e persuasão de vários governadores e vice-reis junto dos comerciantes reinóis que ainda possuíam alguma capacidade económica, gastos oito anos em consultas, reuniões e troca de correspondência entre Lisboa e Goa, o vice-rei D. Pedro António de Noronha de Albuquerque, lá conseguiu constituir uma Companhia de Comércio para os domínios ultramarinos do oriente, em 1694. O modelo queria-se inglês ou holandês, mas, ao contrário das suas congéneres, o consórcio não durou nem meia dúzia de anos. Quem leu a documentação sobre a constituição desta sociedade comercial e conhece a situação política e económica do Estado da Índia, facilmente conclui que a empresa estava destinada ao fracasso porque era notória a «falta de entusiasmo» dos comerciantes portugueses e porque os territórios de Macau e Timor recusaram-se a nela participar, o que restringiu imenso o âmbito da sua actuação.
Mas o que é curioso é que esta companhia comercial chegou ao fim da sua actividade, em 1699, com lucro. É certo que não tanto quanto gostariam os seus accionistas, mas, ainda que assim fosse, pode-se perguntar a razão de tal atitude.
Sem entrar em grandes detalhes, podemos dizer que o Estado da Índia - do qual Moçambique foi parte integrante até 1752 -, não conseguiu encontrar no seio do seu corpo mercantil, um número suficiente de negociantes com condições económicas para suportar a tenaz concorrência indiana que, ano após ano, colocou nos mercados africanos grandes quantidades de panos asiáticos a preços baixíssimos, com os quais comprou em abundância marfim, ouro e alguns escravos.
À coroa, a extinção da companhia de comércio das Índias orientais foi apresentado como um facto consumado. O poder em Lisboa, inebriado com as primeiras remessas de ouro do Brasil, rapidamente esqueceu a «urgente necessidade» de revitalizar a economia da colónia. Em pouco tempo, as autoridades metropolitanas perceberam que a actividade económica indiana em Moçambique enchia os cofres das alfândegas, a tal ponto que a sua presença criou laços de interdependência indispensáveis à manutenção do aparelho administrativo e militar, instituições que garantiam a soberania portuguesa num território que, sendo periférico no contexto do Império português, era, ainda assim, «o único cantinho de que todos [os que residiam no Estado da Índia] se remedeão».[6]
http://www2.iict.pt/?idc=102&idi=12905
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