viernes, 9 de enero de 2009

Espíritu marinheiro-trafico negreiro

Cultura marítima: marinheiros e escravos no tráfico negreiro para o Brasil (sécs. XVIII E XIX)1

Jaime RodriguesDoutorando - UNICAMP

RESUMO Este ensaio aborda temas a partir dos quais pode-se resgatar aspectos da cultura dos homens do mar, em especial aqueles ligados ao tráfico de escravos africanos para o Brasil entre fins do século XVIII e meados do XIX. A partir de uma discussão sobre o trabalho com fontes lacunares, procuro definir os termos dentro dos quais foi entendida a cultura marítima e discutir aspectos tais como nacionalidade e internacionalismo, condição social, idade, processo de trabalho, comportamento, disciplina, enfrentamentos com a natureza e com a hierarquia, linguagem, religiosidade, rituais cotidianos e decisões de ordem prática, estas últimas ligadas à própria sobrevivência e à segurança do grupo e da embarcação.
.................................Tempestades, aparelho danificado, piratas ou navios ligados à repressão da atividade eram os riscos mais comumente mencionados pelos tripulantes interrogados na Comissão Mista Anglo-Brasileira do Rio de Janeiro. Assim foi com a barca Eliza, assolada durante a viagem com as "grandes e crescidas vagas, como pela grande violência do vento do noroeste" que lhe levou o velame pelos ares. Outro tufão "inundou o navio todo" e para dar vazão à água, abriram-se as portinholas. Quando o navio fazia quarenta polegadas de água a cada hora, o capitão achou por bem chamar os demais oficiais e a tripulação, comunicando-lhes que grande parte dos mantimentos e da água perdera-se no temporal, além de quarenta e cinco escravos. Em vista da situação, todos concordaram que o navio arribasse no porto mais próximo - o de Moçambique60. O mesmo teria ocorrido com o Brilhante, em viagem de Ambriz para Montevidéu, quando o navio enfrentou ventos fortes e o mestre consultou os demais oficiais e a tripulação, que resolveram arribar no primeiro porto - Cabo Verde -, pois o mastro grande estava podre e o pano também ia "todo esfrangalhado". O capitão cometeu o deslize de mencionar o verdadeiro destino da embarcação no diário náutico, bem como demonstrou que chamar a tripulação para uma decisão coletiva era o recurso do qual se lançava mão para resolver situações desse tipo.
Novamente, o mestre convocou seus oficiais e tripulação, que "de comum acordo assentaram não entrar naquela ilha, por recearem talvez que fosse o brigue ali prisioneiro" e decidiram ir para Lagos, onde em 25 de outubro do mesmo ano o navio foi apreendido por um brigue espanhol sob o argumento de que o pavilhão imperial não era conhecido pelo capitão apreensor62.
Se o espírito comunitário prevalecia em situações de perigo como estas, havia outras em que o individualismo predominava. Quando uma embarcação negreira era apreendida e levada até um porto para julgamento, nada mais havia a fazer além do salve-se-quem-puder: era isto o que queria dizer a atitude do mestre, piloto, contramestre e mais três marinheiros do Aracaty, que fugiram em um escaler assim que um oficial do navio apreensor subiu a bordo para inspecionar o porão, deixando a bordo apenas dois marinheiros e o cozinheiro da tripulação63.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-01881999000200002&script=sci_arttext&tlng=en

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