viernes, 10 de abril de 2009

Entrevista Mestre Gil Velho,escrito por .M. Y J.P.M.


Entrevista Mestre Gil Velho
Escrito por Luciano Milani & Joel Pires Marques
Quarta, 26 Setembro 2007 16:51

1 - Qual foi seu 1º contato com a capoeira?
Nasci em Recife, capital de Pernambuco, no final da década de 40, século XX. Venho de uma família tradicional, os Cavalcanti de Albuquerque, cuja história se confunde com a própria história do espaço pernambucano. A mistura de elementos indígenas, lusos, holandeses e afro na sua formação, me transmitiu uma memória genética que flui nos meus insight e interagem no meu processo vivencial.
Assim, quando meu Pai se muda para o Rio de Janeiro, no inicio da década de 50, passo a simbiotizar esta perspectiva genética com a leitura da realidade percebida do espaço carioca. Torno-me um pernambucano carioca, com uma passagem rápida por Copacabana e um pouso longo em Ipanema, onde passo minha infância e adolescência.
Ipanema, nesta época se assemelhava a um subúrbio carioca com a diferença de ter o mar e estar na periferia da efervescente Copacabana, mas nas suas praças continham o cenário das cidades de interior, cavalos, charretes, mocinhas dando volta na praça, rapazes territorializando um banco da praça. Nas praias, marcavam-se os espaços por uma grande barraca associada a uma rede de vôlei, no pós praia, a rapaziada deslizava nas ondas na onda do jacaré, de peito ou sobre a tabuas de madeira. Nos bares, a boemia se esparramava no Mau Cheiro, no Jangadeiro, Veloso ou no Zepelim. Os cinemas eram 4, dois poeiras, sem ar condicionado e cadeiras de madeira, o Ipanema e o Pirajá, os luxuosos eram o Paz e o Astória.
Pontilhando este cenário bucólico, emergiam as favelas como a do Cantagalo, Catacumba e a da Praia do Pinto. Neste ambiente, comecei a ler a capoeira através de um discípulo do Mestre Sinhozinho, o Cirandinha, e neste contexto crio minhas raízes cariocas. Acompanho o desenrolar do carnaval de rua, o seu desaparecimento na zona sul e posterior ascensão, através da reconstrução das bandas, como a de Ipanema, e percebo a força que este espaço gerou na cultura carioca, principalmente nas décadas de 50,60 e 70.
2 - Fale um pouco sobre o seu primeiro Mestre?
Luiz Pereira de Aguiar, conhecido no meio da capoeira como Cirandinha Era aluno do Sinhozinho o grande Mestre da Capoeira Moderna carioca. O espaço capoeira do Cirandinha era informal e vários garotos entre eles eu fazíamos a leitura dos movimentos e em grupos de conhecidos sozinhos repetíamos o que tínhamos visto, como também praticávamos esta vivencia em nossas pendengas de rua. Desta forma - muito natural - desenvolvi minha base de capoeira. A sua influência sobre mim foi a de um Mestre que abre espaço para que o discípulo busque em si o seu caminhar.
3 – Conte-nos sobre as diferenças e as influências das capoeiras Sinhozinho e Bimba na sua vida.
Para falar sobre isto preciso entrar um pouco na história do Mestre Sinhozinho e Mestre Bimba e fazer as interações entre estas duas escolas de capoeira que básicas na formação da capoeira atual e a grande base do Grupo Senzala, do qual sou um dos fundadores.
A capoeiragem moderna carioca tem como principal representante o Mestre Sinhozinho (Agenor Moreira Sampaio 1891- 1962). Sinhozinho chega ao Rio, aos dezessete anos, em 1908, vindo de Santos (SP). Era um aficionado por esporte e ao chegar já era um entusiasta em futebol, fazia luta romana e praticava ginástica de aparelhos. Mas foi no Rio, principalmente na Lapa, que viu e se apaixonou pela plasticidade e funcionalidade da temível gestualidade dos malandros, durante os acertos de suas pendengas, que se davam por este tipo de comunicação, denominada aqui de comunicação gestual da capoeira.
Sinhozinho foi morar no morro de Santo Antônio, vivenciando toda a realidade cultural carioca, subsídio para organizar uma estrutura de luta que tivesse por base os elementos da comunicação gestual da capoeiragem carioca, encontra alem disto, um ambiente impregnado por discurso intelectual nacionalista voltado para edificação da ginástica nacional, onde a capoeira é a base desta proposta, veja as propostas de métodos que aparecem nesta fase e os registros de discursos e em jornais como O Pais, a revista Kosmo e tantos outros.. Mas, o mais interessante, é que a capoeira numa perspectiva metodizada está dentro de sua ótica esportiva, sendo assim facilmente absorvida por ele. De interessante a provável mistura feita, por ele entre o universo dos métodos e do contexto dos malandros. (Anexo 4)
Em 1930, após já ter uma vivência em termos de movimentação de lutas e atividades esportivas, pois neste período foi instrutor de educação física, campeão de levantamento de peso, instrutor da Policia especial do Distrito Federal entre outros, reuniu sua primeira turma de alunos particulares, a quem ensinava capoeira de graça.
Sua primeira "academia" no Quintal de sua casa na rua Redentor, foi também a primeira academia de ginástica de Ipanema. Depois, sempre em Ipanema, passou por diversos endereços, como nas ruas Visconde Pirajá, Saddock de Sá e muitas outras, terminando na rua Prudente de Morais em frente à praça General Osório, quando morreu em 1962.
SINHOZINHO - marcou o cenário da capoeiragem moderna carioca, nos anos 30, 40 e 50, formando capoeiristas, boxeadores e remadores. Entre seus alunos famosos destacam-se Tom Jobim, que foi uma personalidade do mundo musical carioca e brasileiro e, como capoeira e desportista Rudolf Hermanny, que foi também campeão de judô no Pan-Americano do México em 1960. Entre os que participavam, do seu espaço de movimentação, podemos destacar: Paulo Azeredo, Paulo Amaral, Sílvio M. Padilha, André Jansen, Bruno e Rudolf Hermanny, Luiz Pereira de Aguiar (Cirandinha), Eloy Dutra, Carlos Alberto Petezzoni Salgado, Joaquim Gomes (Kim), Telmo Maia, Tom Jobim, Carlos Madeira, Darke de Mattos, Comandante Max, Paulo Lefevre, Paulo Paiva, Bube Assinger, Wanderley Fernandes (Pára-quedas), José Alves (Pernambuco), Carlos Pimentel, Lucas e Haroldo Cunha, Manoel Simões Lopes, Flávio Maranhão, Carlos Alberto Copacabana, e numerosos outros. Foram gerações sucessivas, daí a dificuldade de citar todos.
Paralelamente em Salvador, onde não existe registro sobre movimentos sociais de capoeira, numa perspectiva organizacional como a carioca no séc. XIX surge, a figura de Manoel dos Reis Machado, Mestre Bimba. Bimba abriu, numa academia de Salvador, suas aulas de “Luta Regional Baiana”, apresentando um treino disciplinado onde se aprendiam golpes numa seqüência padronizada. Além de golpes novos e treinos sistemáticos, introduziu elementos musicais como o pandeiro e o berimbau, formando a bateria, onde através de vários ritmos, associados a cânticos se praticava a luta marcial. Talvez evitando associações com a capoeira, que era ainda proibida, chamou de luta regional. Regional porque dizia que era originária de sua região, no Recôncavo baiano.
Lembrando aqui, que a construção do processo de capoeira como sport, tanto da regional de Bimba, como a de Sinhozinho, conviveu com a existência de algumas propostas de métodos organizando a estrutura da capoeira para uma luta marcial.
É, neste período, que a estratégia nacionalista de Getúlio Vargas, coopta a Capoeira e abre o caminho para transformá-la em Educação Física e Esporte, dentro de seu projeto populista.
Foi assim que Mestre Bimba apresentou ao Interventor da Bahia (espécie de Governador na fase Getuliana), uma exibição de sua luta, recebendo permissão para legalizar sua academia, dando início ao período da moderna capoeira. Em 1934, Getúlio Vargas, interessado no voto feminino, dos analfabetos, dos soldados, etc, extingue o decreto-lei que proibia a Capoeira e a prática de cultos afro-brasileiros. Mas, por outro lado, obriga que tanto os cultos quanto à Capoeira sejam realizados fora da rua, em recintos fechados, com um alvará de instalação. A iniciativa de Bimba teve um imenso sucesso, ganhou projeção nacional e foi adotada pelo próprio regime do Estado Novo como exemplo de “Luta Nacional” tirando a capoeira do limbo da rejeição. Manoel dos Reis Machado chegou a ser chamado para dar treinos nas Forças Armadas e na Academia de Polícia.
Segundo Liberac Mestre Bimba, passou por um longo percurso até chegar a hierarquia superior no que tange a “cultura popular” Ele reelaborou a capoeira construindo-a como símbolo cultural. Para construção de sua luta regional, Bimba redesenha a estrutura do gestual de sua realidade cultural baiana, pois ele achava a capoeira que se praticava na Bahia muito fraca como luta, por possuir um numero de golpes reduzidos e seu uso era mais para exibições em praça pública por “pseudos-capoeiristas”. Na construção de sua perspectiva de luta buscou no Batuque e nos movimentos de luta vivenciados e em manuais de luta marcial de seu tempo, os elementos que vão estruturar a sua luta regional, lembrando que teve, provavelmente, grande ajuda do grupo de alunos que o cercava, pois a grande maioria era da elite de Salvador e de grau de educação refinado. ..........................CONTINÚA NO LINK
http://www.portalcapoeira.com/Rio-de-Janeiro/entrevista-mestre-gil-velho

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