jueves, 26 de febrero de 2009

Colonos em Moçambique

foto:Mulher do fotógrafo J. Wexelsen fotografada na Beira - Moçambique, 1907. Colecção João Loureiro


A ambigüidade existente sobre sua localização decorre do baixo número de portugueses instalados na região, sendo que destes poucos lusitanos que habitavam a África Oriental, a grande maioria era composta por homens degredados para servirem nas tropas da Coroa lusitana, mas que ao chegarem à região desertavam “[...] sem a menor razão ou desculpa, preferindo trabalhar como escravos dos muçulmanos, hindus e hereges, a ser vassalos do seu rei”205. No território oriental-africano controlado por Portugal, em 1720, viviam menos de 2000 cristãos portugueses, indianos e mestiços, e alguns milhares de africanos na condição de livres e escravos206. Os colonos se inseriram no comércio interiorano, casaram-se com as filhas dos régulos locais, deram assistências militares aos chefes tribais e conseguiam passe livre no comércio. Eles se “africanizaram”. Em poucos anos de residência na África Oriental, tiveram filhos mulatos e, habitando as aldeias do interior, começaram a viverem à africana207. Era uma prática comum entre os colonos portugueses assentados na África Oriental o reconhecimento da autoridade do soberano local.



......................tendiam a se africanizar completamente no espaço de duas ou três gerações”210....................................... A “africanização” dos colonos incidia diretamente na diminuição do poder lusitano sobre a África Oriental, assim como no afastamento das relações entre esta região africana e a América portuguesa. A África Oriental estava mais voltada para o comércio, sobretudo a venda de escravos para os traficantes ingleses, franceses e holandeses instalados no Oriente e nas ilhas ao longo da Costa Oriental africana.








Deixando intocado o processo produtivo, os portugueses não conseguem reorientar a seu favor os circuitos regionais de comércio. Por muito tempo as trocas permanecem voltadas para o Norte e para o Leste, com os árabes de Oman manobrando o tráfico para o golfo Pérsico, principal mercado consumidor de escravos naquela parte do globo. Aliás, é somente em 1756 que Moçambique recebe a primeira tabela aduaneira portuguesa de cobrança de direitos de exportação sobre escravos. Ou seja, dois séculos e meio depois da entrada em vigor de pautas similares elaboradas para a Guiné portuguesa, e duzentos anos mais tarde das que entraram em vigor no Congo e em Angola. Afora remessas esporádicas, o Brasil só recebe regularmente escravos da África Oriental a partir do início do século XIX217.




.................... Na verdade, antes da introdução portuguesa na África Oriental, essa região, a pelo menos um milênio e meio, já se conectava a Comores, Madagascar, a Meca, ao Iêmen, a Omã, à Índia, à Pérsia, ao Ceilão, à Indonésia e à China. Estas rotas comerciais eram dominadas pelos muçulmanos, que regularmente enviavam navios à África Oriental.




........................... Com efeito, os suaílis continuaram a disputar o comércio com os portugueses. Não apenas aquele que se dirigia para o oceano Índico, mas também o do interior, dominado pelos africanos animistas219. Os suaílis, não raro, buscavam nas feiras do interior ouro, marfim e, em menor escala, escravos que trocavam pelos tecidos indianos com os portugueses220. Apesar da incômoda posição de intermediários dos suaílis para os portugueses, as tentativas de expulsá-los se tornaram frustrantes aos intentos da Coroa, pois os suaílis eram numerosos, bem integrados aos animistas locais, conheciam bem a região e mantinham estreitas relações comerciais e políticas com a Arábia, Pérsia e Índia221.




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Lovejoy afirma que durante o século XVIII, cerca de apenas 400.000 escravos saíram da África Oriental, sendo que por volta de 2/3 destes foram remetidos ao Oriente e o 1/3 restante dividiu os mercados das ilhas Mascarenhas, sob jugo francês, e a América portuguesa227. Durante praticamente todo o século XVIII, a América portuguesa e a África Oriental encontravam-se comercialmente separadas. Os poucos aventureiros luso-brasileiros que se arriscavam na “Contracosta” africana buscavam cativos para trocarem por tecidos na Índia, e de posse desses produtos indianos, faziam nova permuta por escravos na região da África Centro-Ocidental228. Este tráfico para a América portuguesa era tão ínfimo em volume que D. Francisco de Almeida e Portugal, o Conde de Assumar, que havia sido governador de Minas Gerais entre 1717 e 1721, enviado à Índia como vice-rei em 1744, então em escala em Moçambique, se espantou com o baixo preço de venda dos escravos na região, observando ainda que estas mesmas peças valeriam mais de dez vezes os seus valores na costa Ocidental africana. Enfim, ele não entendia porque não se exportava maiores quantidades de escravos de Moçambique para a América portuguesa229.




...................... Tidos nas Minas Gerais do século XVIII, como “[...] do tipo retinto, gostavam muito de danças e de festas, de música, usavam grandes argolões, cordões de ouro e miçangas diversas”230, a nação moçambique era uma nação genérica para todos os escravos enviados da África Oriental para as Minas do século XVIII. Mesmo quando as exportações de Moçambique para as Américas cresceram depois de 1780 231, os portugueses e os luso-brasileiros, principalmente os da praça mercantil do Rio de Janeiro, utilizaram destes escravos quase que exclusivamente no comércio no Rio da Prata232, fazendo com que suas representações fossem pouco afetadas na América portuguesa. Foi somente na primeira metade do século XIX, quando aumentou o número de escravos da África Oriental enviado à América portuguesa233, é que apareceram outras nações da África Oriental, como mombaça, quelimane, inhambane e quiloa. Mesmo assim, muitas dessas denominações ficaram restritas ao Rio de Janeiro234. Aliado a isto, as representações atribuídas aos indivíduos de nação moçambique no Rio de Janeiro no século XIX, seriam diferentes daquelas encontradas em Minas Gerais no século anterior.




................................a pouca miscigenação dos grupos de cultura portuguesa na África Ocidental refletiu na maior distância entre os não-africanos do Império português e os africanos da Costa Ocidental.





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