jueves, 15 de enero de 2009

Sinhozinho e a Capoeira dura




As máximas de Sinhozinho revelam um mundo de guerra, em que vivia o matimbeiro. Isto evidenciava porque a capoeira não havia se tornado, no Rio de Janeiro, uma arte de “academias”. Sinhozinho era uma exceção, porque fora instrutor de capoeira na Marinha e da Polícia Especial (depois tornada Polícia de Vigilância). Tinha, pois muitos alunos e amigos na Polícia .
Daí as dificuldades que a “arte do buzo” passou, com o desaparecimento (e policiamento) dos terrenos vazios, ermos etc. A partir dos anos 50, com a abertura de academias Regional e de Angola no Rio de Janeiro, a tendência da matimba foi descaracterizada. Isto é compreensível também pela sua violência, muito mais aberta do que a capoeira baiana e, por isso, identificada como “coisa de malfeitores” no Rio.
Outro ponto que deve haver contribuído para o quase desaparecimento da matimba foi sua consciência mimética, ou seja a ênfase com que ela copiava os animais e era autohipnótica. Uma boa parte do movimento corporal da capoeira hoje é prazer estético, compartilhado com que assiste a roda, particularmente leigos. Esta situação psicológica difere da prática do buzo, em que havia uma ruptura com o público eventual, praticamente ignorado. As constantes saídas do ritmo da ginga, para surpreender o adversário, davam à matimba uma “eletricidade ruim”, bastante similar às brigas verdadeiras, em que o “público” tinha que cuidar-se, para não “levar as sobras”.
O mimetismo impunha uma grande exigência performática ao praticante. Carregadores, estivadores, pescadores e pedreiros de um mundo sem máquinas, descendentes de escravos, encontravam-se fisicamente a altura das demandas étnico-culturais da arte do buzo. No entanto, num ambiente de tratores, caminhões, guindastes e pás-carregadeiras; um mundo em que predomina o trabalho industrial, há uma oferta menor de praticantes potenciais para a arte corpórea ‘Nbantu. A matimba era um modo de vida, em que seus praticantes eram também a “segurança” dos “terreiros-de-santo”. Este ambiente deixou de existir.
O vigor físico dos matimbeiros criou lenda. Sinhozinho dizia que Neném e que Sinhô, “passavam mais tempo no ar do que na terra”. Mas que isso “não seria de admirar em Neném”, que era esguio, mas era assombroso em Sinhô, que “era um negro parol”. Ora, parol é um barril ou caçamba grande, o que significa que Sinhô era gigante. Mangueira, Mangueirinha, Vavá e Waltão, jogadores que conheci, saltavam em “mortais”, deixando os tamancos e enfiavam neles os pés, quando caíam, sem qualquer deslize. Percebe-se a dificuldade, quando se tenta fazê-lo. Vê-los praticar dava-nos a impressão que, qual beija-flores, pairavam, por instantes, no ar, sem respeito pela lei da gravidade.
“Derruba esse nego
bota no chão, quero ver
se ele é bom
oi, derruba esse nego”
etc
No jogo ritmado pelas caixas a velocidade se fazia perigosa, e os pares se substituíam rapidamente. É possível que a explosão vertiginosa da “capoeira dura” no Rio de Janeiro fosse devida a uma grande concentração ali de ex-combatentes dos batalhões especiais da Guerra do Paraguai. Deste modo, a “Corte”, futuro “Distrito Federal”, assistiu uma consolidação da arte corporal mais rapidamente do que a Bahia e o Recife.



Na década de 1930 Sinhozinho ensinava e praticava capoeira em academias e instituições militares, sua capoeira visava um tipo de eficiência que a diferencia da capoeira atual.
Quando perguntado sobre a capoeira do Sinhozinho, Mestre Celso nos respondeu:

“Não cheguei a ver não, na polícia especial tinha uns caras que diziam que eram capoeiristas do Sinhozinho, naquela época eu não cheguei a ver. Eu era garoto meu irmão foi guarda civil. Meu irmão não chegou a fazer isso não, a ser capoeirista do Sinhozinho. Na polícia especial tinha capoeira.” (Mestre Celso, 23/04/2002)

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